2. A CAMINHO DE UMA TRADIÇÃO MAIS PRÁTICA
DA MÚSICA ESPECULATIVA À MÚSICA PRÁTICA
A educação de Lutero dentro do conjunto do quadrivium dava ênfase à
música como uma ciência especulativa (musica speculativa). A
compreensão da música estava baseada nos ensinamentos de filósofos gregos
como Platão, Aristóteles e Boethius. Estes filósofos entendiam a música
real, executada pelos músicos, como algo inferior, uma mera sombra da
música celestial das esferas. A tendência era ver a música como um reflexo
da estabilidade e continuidade de um universo ordenado.
Especialmente em seus primeiros escritos Lutero se deixa influenciar
por estes pensamentos, mas também em escritos posteriores eles aparecem,
como em suas preleções sobre Gênesis da década de 1530:
Assim não nos maravilhamos com a maravilhosa luz do sol porque é
um fenômeno diário. Não nos maravilhamos com os outros incontáveis
dons da criação, pois nos tornamos surdos àquilo que Pitágoras
apropriadamente denomina esta maravilhosa e mais querida música
vinda da harmonia dos movimentos que estão nas esferas celestes.15
Em seus escritos mais antigos Lutero teve também influência dos pais
apostólicos e exegetas medievais antigos, interpretando passagens
relacionadas à música em sentido espiritual ou místico, vendo, muitas vezes,
alegorias, além da interpretação literal. Lutero comenta em suas preleções
sobre o Salmo 81:
Eu disse que alegoricamente a lira é Cristo e o salmo suas obras e
palavras, enquanto que a harpa é a igreja unida a ele. E estas duas
combinadas em conjunto são agradáveis. Ou, o mesmo Cristo é a
harpa por causa do sofrimento e a lira por causa da ação, mas
ambas agradáveis ao mesmo tempo. Ou, ele é a doce lira e tem que
ser recebido com a harpa (isto é, ele com a igreja), ou é ele
trabalhando consigo mesmo enquanto sofre.16
Com referência a instrumentos, no Salmo 33 Lutero diz:
Deus é para ser louvado pelos cristãos e ele é louvado hoje com
ambos [saltério e harpa] e com muitos outros instrumentos. Todavia
é mais apropriado tomar os instrumentos num sentido místico, assim
que somente Deus, e não o homem, possa ser louvado por eles...
14 Carl F. Schalk, Luther on Music: paradigms of praise, pp. 16-17.
15 LW 1:26.
16 “Primeiras Preleções sobre os Salmos” (1513-15), LW 11:103.
10
Igreja Luterana - nº 1 - 2003
Em primeiro lugar a harpa é o próprio Cristo de acordo com a
natureza humana, que foi estendido na cruz por nós qual uma corda
numa harpa. Portanto confessar com a harpa significa pensar sobre
os atos e sofrimentos de Cristo de acordo com a carne, pois tal
meditação tem sua ressonância proveniente de baixo, da humanidade
para a divindade.17
No entanto, para Lutero como teólogo, a música não tinha primariamente
um sentido alegórico ou místico, mas era antes de tudo uma arte prática,
estreitamente ligada à teologia e proclamação da Palavra, servindo também
ao ensino. O uso que o próprio Lutero fez da música comprova isto. Ele
mesmo compunha e tocava flauta e alaúde, conhecia a produção musical
histórica e de sua época e insistia que pastores e professores fossem treinados
na música. Achava também que as crianças deveriam aprender música.
Especialmente lembrava que a música deveria servir ao louvor na igreja.
DA MÚSICA ESPECULATIVA À MÚSICA PRÁTICA
A educação de Lutero dentro do conjunto do quadrivium dava ênfase à
música como uma ciência especulativa (musica speculativa). A
compreensão da música estava baseada nos ensinamentos de filósofos gregos
como Platão, Aristóteles e Boethius. Estes filósofos entendiam a música
real, executada pelos músicos, como algo inferior, uma mera sombra da
música celestial das esferas. A tendência era ver a música como um reflexo
da estabilidade e continuidade de um universo ordenado.
Especialmente em seus primeiros escritos Lutero se deixa influenciar
por estes pensamentos, mas também em escritos posteriores eles aparecem,
como em suas preleções sobre Gênesis da década de 1530:
Assim não nos maravilhamos com a maravilhosa luz do sol porque é
um fenômeno diário. Não nos maravilhamos com os outros incontáveis
dons da criação, pois nos tornamos surdos àquilo que Pitágoras
apropriadamente denomina esta maravilhosa e mais querida música
vinda da harmonia dos movimentos que estão nas esferas celestes.15
Em seus escritos mais antigos Lutero teve também influência dos pais
apostólicos e exegetas medievais antigos, interpretando passagens
relacionadas à música em sentido espiritual ou místico, vendo, muitas vezes,
alegorias, além da interpretação literal. Lutero comenta em suas preleções
sobre o Salmo 81:
Eu disse que alegoricamente a lira é Cristo e o salmo suas obras e
palavras, enquanto que a harpa é a igreja unida a ele. E estas duas
combinadas em conjunto são agradáveis. Ou, o mesmo Cristo é a
harpa por causa do sofrimento e a lira por causa da ação, mas
ambas agradáveis ao mesmo tempo. Ou, ele é a doce lira e tem que
ser recebido com a harpa (isto é, ele com a igreja), ou é ele
trabalhando consigo mesmo enquanto sofre.16
Com referência a instrumentos, no Salmo 33 Lutero diz:
Deus é para ser louvado pelos cristãos e ele é louvado hoje com
ambos [saltério e harpa] e com muitos outros instrumentos. Todavia
é mais apropriado tomar os instrumentos num sentido místico, assim
que somente Deus, e não o homem, possa ser louvado por eles...
14 Carl F. Schalk, Luther on Music: paradigms of praise, pp. 16-17.
15 LW 1:26.
16 “Primeiras Preleções sobre os Salmos” (1513-15), LW 11:103.
10
Igreja Luterana - nº 1 - 2003
Em primeiro lugar a harpa é o próprio Cristo de acordo com a
natureza humana, que foi estendido na cruz por nós qual uma corda
numa harpa. Portanto confessar com a harpa significa pensar sobre
os atos e sofrimentos de Cristo de acordo com a carne, pois tal
meditação tem sua ressonância proveniente de baixo, da humanidade
para a divindade.17
No entanto, para Lutero como teólogo, a música não tinha primariamente
um sentido alegórico ou místico, mas era antes de tudo uma arte prática,
estreitamente ligada à teologia e proclamação da Palavra, servindo também
ao ensino. O uso que o próprio Lutero fez da música comprova isto. Ele
mesmo compunha e tocava flauta e alaúde, conhecia a produção musical
histórica e de sua época e insistia que pastores e professores fossem treinados
na música. Achava também que as crianças deveriam aprender música.
Especialmente lembrava que a música deveria servir ao louvor na igreja.